Diferente do que se propaga, a data 8 de março atribuída ao dia Internacional da mulher não surgiu em decorrência do incêndio em Nova Iorque no qual 125 mulheres morreram numa fábrica com precárias condições trabalhistas. Até porque essa tragédia foi dia 25 de março de 1911.
A primeira ocorrência envolvendo a militância feminista e o dia 8 do terceiro mês do ano foi em 1917 na Rússia czarista. Trabalhadoras do setor de tecelagem organizaram uma greve e de acordo com Blay (2001) para Trotski essa manifestação foi o primeiro ato da Revolução de Outubro.
Embora haja distorção histórica e geográfica sobre a data um fato é comum: a luta feminina começou com a luta social. As manifestações e greves cresciam em decorrência da exploração do trabalhador no setor industrial e as mulheres eram ativas em suas participações, porém o próprio sindicato não lhes representava sob o discurso que era necessário resguardar o salário do homem num primeiro momento.
Compreendendo que eram reféns das regras de um jogo extremamente machista e patriarcal, o movimento sufragista foi ganhando cada vez mais adeptas na esperança de que conquistado o direito do voto e de se lançarem candidatas, pudessem assim conquistar outros direitos até então restritos ao grupo masculino.
Um cenário truculento as aguardava: policiais que manchavam de sangue as manifestações e a receptividade violenta e hostil de patrões, colegas de trabalho e até do próprio cônjuge.
Por mais exploradas socialmente que fossem tais quais seus companheiros de trabalho, ainda levavam a marca por serem mulheres e dificilmente encontravam apoio entre os homens. Lutavam por melhores condições de trabalho junto com eles, mas nas suas lutas por voto estavam praticamente sozinhas. Lutavam por melhorias salariais, mas não podiam contar que os homens aceitassem a igualdade salarial. Sofriam assédio sexual e seus colegas fechavam os olhos quando não as tratavam como prostitutas dentro do espaço de trabalho. Na própria esquerda, por mais vanguardista que se propunha ser, muitas vezes a mulher era tratada como cidadã de menor importância.
Muitas coisas foram conquistadas pelas mulheres. Se hoje frequentamos escolas e universidades, podemos fazer usar contraceptivos, votar, candidatar a cargos políticos, se há creches, delegacia da mulher, Lei Maria da Penha, se temos o direito ao divórcio, tudo isso foi decorrente de muita luta entre várias de nós que levantaram a bandeira da igualdade de gênero.
Contudo, há muito também a ser feito. Acabar com a tradição da mutilação genital feminina, violência doméstica, tráfico de mulheres, propagandas e indústria cultural que objetificam a mulher, piadas machistas, a cultura do estupro, a desigualdade salarial, violência obstétrica, o grande número de mulheres mortas vítimas de aborto em clínicas clandestinas, a parca participação no meio político... são demandas urgentes que precisam estar na agenda de luta.
Buscar alterar esse quadro é buscar concomitante outro tipo de sociedade. É atrelar a luta de gênero à luta social, raiz da onde surgiu o movimento feminista.
Não queremos apenas mais creches para nossos filhos! Queremos redução da carga horária para termos mais tempo com a família e melhores condições de saúde física e mental! Não queremos apenas igualdade salarial em relação aos homens! Mas, um salário digno que possibilite a classe trabalhadora o acesso aos bens materiais, culturais e de lazer produzidos socialmente. Não queremos que apenas acabe com a violência de gênero, mas uma sociedade que não coisifique as pessoas, que não as trate como mercadoria.
O protagonismo desta luta é de nós mulheres, mas não impede que os homens, esclarecidos dessa urgência também tomem parte desse movimento. Historicamente os homens não escutaram nosso soluços nem nossos gritos e ao não se sensibilizarem com a dor alheia foram se desumanizando. Porém, uma vez que o machismo é cultural haveremos de contrapô-lo e buscarmos a humanização de opressores e oprimidos no compromisso por uma sociedade mais justa.
Ana Paula Ferreira
08/03/2016
BLAY, EVA ALTERMAN. 8 de março: conquistas e controvérsias. Rev. Estud. Fem. [online]. 2001, vol.9, n.2, pp. 601-607.
CARNEIRO, Adriana Jacob. A cobertura midiática do dia internacional da mulher: fatos e controvérsias. 25 a 27 de maio de 2010 – Facom‐UFBa – Salvador‐Bahia‐Brasil
Texto publicado nos jornais:
MANTIQUEIRA -POÇOS DE CALDAS, DOMINGO, 13 DE MARÇO DE 2016
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