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quarta-feira, 30 de março de 2016

África: metodologia de ensino

Aula: África

Objetivos:
Os educandos devem ser capazes de:
ü  Perceber a multiplicidade cultural da África, rompendo com a visão que considera homogênea.
ü  Compreender o continente não como atrasado, mas um reflexo por ter sido oprimido pela Europa, estabelecendo análise de seu contexto em vários fatores.
ü  Valorizar sua cultura e história de luta.

Metodologia:

ü  Apresentação em Power Point de imagens relacionadas África na seguinte ordem: 
·         Mapa (marco situacional – apresentação de que é um continente formado por diversos países, cada qual com uma realidade diferente).
·         Paisagens naturais (savana e comparação com o cerrado brasileiro, riqueza da fauna, comparação de alguns elementos culturais entre indígena e o africano, Baobá; floresta; deserto do Saara em dois aspectos e o estereótipo do cinema).
·         Paisagens humanas (construções egípcias, Império do Mali, urbanização, artesanato, agricultura).
·         Culturas (máscaras, griots, tambores, símbolos africanos).
·         Religiões (tradicionais, islâmica, cristã e o desrespeito da Igreja Universal com a cultura africana).
·         Ocupação europeia (escravidão e a exploração das riquezas como ouro e marfim, sistema de apartheid para controlar os negros).
·         Problemas sociais e políticos (direcionar para que entendam que a pobreza da África alargou-se com a invasão europeia gerando desigualdade entre negros e brancos, fome, problemas de saúde pública (HIV, ebola), conflitos armados).
·         Formas de resistência: Nzinga, significado da bandeira da Etiópia, Mandela.
·         Frases do Mandela: reforçar a ideia de que todos dependem de todos e da importância da educação para reverter o quadro de exclusão.

Avaliação:
ü  Participação e interesse na exposição da aula.
ü  Leitura do cordel de Antonio Héliton de Santana “A vida e a invasão da África Antiga” e exercícios de interpretação.

ü  Para Casa: Faça um desenho sobre a África em algum dos aspectos: paisagem natural, paisagem humana, cultura, religião, invasão européia, problemas sociais, etc. Critérios: Faça o desenho e pintura ocupando a folha toda, escreva na parte inferior um nome para sua obra, seu nome e a data.
Para ver os slides clique aqui.

terça-feira, 22 de março de 2016

Praça dos Macacos – Praça Dom Pedro II

            O grupo cultural Afro-brasileiro Chico Rei organizou com muita competência um debate na Praça Dom Pedro II a respeito nome popularmente conhecido como “Praça dos Macacos”.
            Com um respeito à diversidade de opiniões e de memórias históricas o grupo Chico Rei chamou duas pessoas com perspectivas diferentes para falarem sobre o tema: o arquiteto e coordenador do museu Haroldo Gessoni e o memorialista e jornalista Roberto Tereziano.
            O primeiro, baseado dentre outras fontes na obra da museóloga Nilza Megale e do historiador  Homero Ottoni, citou que provavelmente essa alcunha “Macacos” derivou da correspondência que veranistas cariocas fizeram da região com uma área do Rio de Janeiro e citando a obra de Mario Mourão, disse que outra explicação se deve ao fato de que naquela localidade havia macacos.
            Roberto Tereziano completou em alguns momentos e contrapôs em outros. De acordo com o jornalista a área era pantanosa e, portanto, dificilmente haveria macacos e isso pode ser provado mediante fotos que mostram a geografia da época. Sobre a comparação com um local do Rio de Janeiro, Tereziano afirmou que certamente houve a relação, mas não pelos aspectos físicos de ambas as regiões, mas porque eram redutos de ex-escravos. Detalhou que até mesmo o zelador da praça era conhecido como Pedro Macaco e que na obra de Mauro Mourão há uma citação na qual este avisa que na área havia pequenos primatas, mas coincidentemente também havia negros.
            A discussão do nome da praça foi uma alavanca para discussão sobre o local do negro na sociedade brasileira. Passado e presente se entrelaçavam e mostravam nós que precisam ser desembaraçados.
Os nós que foram observados são maiores e mais densos. Nós na construção urbana que empurram o negro para áreas periféricas; que exaltam nas praças principais esculturas do homem, branco e da elite enquanto a Praça do Zumbi está abandonada; que segregou a Igreja São Benedito por ser um santo negro cultuado principalmente por esse grupo e hoje religiões de matriz africana refugiam-se nos bairros. Nós na compreensão cultural e de memória de um povo quando se seleciona apenas a história oficial para ser contada, quando se imagina viver numa democracia racial. Nós sociais ao se constatar o quão vulnerável é o grupo afro-descente em relação à segurança, moradia, emprego, educação e saúde.
Houve apontamentos e reflexões, relação entre passado e presente, levantamento da situação de marginalização antes e atualmente. Portanto, em nenhum momento se concluiu mudar o nome da praça. Para os desavisados que adoram engrossar o caldo da crítica pela crítica, não é essa a pretensão. Tem-se a clareza que mudar o nome não é a solução, uma vez que já consta no imaginário popular, embora seja importante reforçar o nome oficial: Dom Pedro II.
Esse pode ser um início para desembaraçar os nós do racismo. Mas, só haverá reparação de fato em relação à população negra quando dispuserem de igualdade de condições com a população não negra. Isso só seria possível juntamente com uma visão de classe social, afinal o grupo afro-descente de um modo geral não pisa no chão da casa-grande e enquanto houver casa-grande haverá senzala. Aí está o maior nó.

Ana Paula Ferreira

02-03-2016

Escola: dependência das datas comemorativas

Escolas começam o ano pedindo um texto ou um desenho sobre as férias. Em fevereiro dão algum desenho da Mônica em trajes carnavalescos. Quando chega abril, o desenho é do Índio e em maio pontua sobre o dia do trabalhador. Em agosto é certo: todas escolas tratarão do tema folclore, mas muitas vezes a abordagem será em torno do Saci. Setembro tem dia da independência, em outubro dia das Crianças, novembro Proclamação da República e Consciência Negra e dezembro é Natal!
            Depois ainda muitos professores se queixam que os alunos estão desinteressados! Não é para menos... Desde a Educação Infantil seguindo a mesma lógica, os mesmos temas no mesmo período e as vezes até com a mesma abordagem!
            Há uma dependência tão grande em relação às datas comemorativas que mesmo no maternal, que atende crianças de 3 e 4 anos cheguei a ver atividade nomeada como “Dia do Telefone”. O que isso acrescenta a essa faixa etária? O que comemorar ou lembrar dessa data significa? É mais importante saber o dia da invenção do telefone ou desenvolver capacidades comunicativas com crianças nesse período do desenvolvimento?
            Precisamos sim falar sobre a questão indígena na contemporaneidade, o negro na sociedade atual, o folclore, carnaval e festa junina como expressões culturais de nosso povo. Para isso, devemos ter cuidado para não cair nas armadilhas do estereótipo, do trabalho raso, da atividade pela atividade, sem fundamentos, ausente de reflexão.
            Ao dar uma folhinha e pedir para pintarem, primeiro tolhemos a imaginação e criatividade de serem os protagonistas de sua própria arte e segundo que apresentamos o vazio e o preconceito, embora o preconceito esteja sempre cheio de algo.
            O vazio porque a atividade não explora uma série de questões, não contextualiza, não mostra o processo histórico, não cria outros significados, não problematiza. Fica um conteúdo esvaziado de sentido. Instiga o preconceito porque ao tratar de forma superficial, cria o estereótipo e limita a figura a um tipo apenas de imagem e de representação, geralmente distorcida, e daí se perpetua o índio que tem sempre penas na cabeça, o trabalhador sempre com roupas de operário, o negro com vestes de escravidão.
            Por isso que embora os alunos façam alguma atividade todos os anos sobre o Dia da Independência ou qualquer outra data, não saberão falar sobre o assunto mesmo estando no 5° ano do Ensino Fundamental, e terem visto isso por vários anos.
Enquanto professores que nos libertemos das datas comemorativas! Não precisamos nos afastar por completo do trabalho com datas, afinal datas festivas precisam ser lembradas como expressão cultural, mas que coloquemos o assunto na importância que possui, sem tratá-lo como evento, ou fato superficial, indagando se é importante a data ser estudada com determinada turma, escolhendo as datas que convém serem trabalhadas com aquela faixa etária e com qual abordagem. 

Ana Paula Ferreira

02/01/2016

domingo, 20 de março de 2016

Samba com consciência: Ala das Fridas

Era pra ser só uma brincadeira de carnaval. Uma mãe, com a filha e sobrinha, não querendo fantasiá-las com as típicas princesas resolveu incentivá-las a se vestirem de Frida. Por que Frida? Porque feminista, a frente de seu tempo, uma mulher que aliou a aspereza da política com a sutileza da arte, porque fugia dos padrões estéticos, porque valorizava as cores latinas e implantava um estilo próprio de roupa, de cabelo, de ser se vestir e de ser, não com os olhos voltados para a Europa, mas para a terra onde pisava.
Consequência: nenhum folião entendia aquelas sobrancelhas emendadas e o buço marcante em plena época de culto pela depilação. Por outro lado, a partir dali o universo infantil dessas garotas não ficaria recheado apenas com Elsas e Brancas de Neve, mas seriam ensinadas a admirar personalidades fortes, tal qual a Frida, mulher da nossa América que desafiou modismos e convenções, fez uma arte própria, participou de partido político de esquerda e buscou superar com pincéis e tintas as próprias frustrações, medos e dores decorrentes de uma saúde extremamente debilitada.
Esse ano a ideia não era para três pessoas. Era de se formar uma ala de Fridas, de mulheres dispostas a usar do carnaval trazendo uma conotação de luta, de feminismo, que do contrário do que muito pensam, não é antônimo de machismo. Feminismo é o empoderamento da mulher, é a defesa de igualdade de gêneros, é a mulher ser tratada como sujeito de ações e opções e ser respeitada por isso.
A ala das Fridas dentro do bloco Chico Rei se distanciaria do imaginário popular de se atrelar a figura da mulher a Rainha da Bateria, símbolo de sensualidade. Também não se pareceriam com as baianas, porque apesar das grandes saias que possuem em comum, as Fridas trariam o significado feminista.
Uma ala alegre, florida, com saias rodadas, mulheres e homens vestidos de Frida como denúncia de um machismo e de uma sociedade desigual em que a figura do homem branco, hetero, classe média, cristão é mais valorada socialmente.
Foi lindo contribuir para que mais pessoas reconhecessem a figura importantíssima e altamente simbólica da Frida. Foi inesquecível fazer parte dessa história que tem tudo para virar tradição. Contudo, que lembremos que se a Frida virar apenas uma fantasia perde seu caráter de apelo a reflexões sobre a condição opressora em que vive a mulher no Brasil. Daí deixa de ser “Sou Frida” e fica apenas “Sofrida”.


Ana Paula Ferreira
Fev/2016

Texto também publicado no Jornal da Cidade 09/02/2016 https://www.jornaldacidade1.com.br/ala-das-fridas/  

Avaliação geral da paralisação

A paralisação de três dias em Poços de Caldas teve ranços e avanços, mas foi um momento histórico.
Faz oito anos que sou funcionária pública municipal e nunca havia presenciado isso. Não digo apenas pelo número de escolas fechadas, nem pela quantidade de dias em ação, mas o reflexo de uma ação conjunta repercutindo em mais de 700 pessoas nas ruas em pleno horário de aula diante da união entre trabalhadores do Estado, trabalhadores do municípioe alunos.
O bem simbólico é imenso... inúmeros professores tiveram pela primeira vez a experiência reivindicatória e se superaram na iniciativa propositiva: foram para ruas, panfletaram, fizeram varal de cartazes com as reivindicações, conversaram em várias unidades com muitos servidores, enfrentaram opiniões contrárias, inseguranças e aversões. Se o corriqueiro no intervalo de aula eram conversas sobre culinária, filhos ou programa de TV, de repente o recreio se transformou em momento de politização sobre direitos trabalhistas, lei do Piso Nacional e FUNDEB; se o convencional é trabalhar numa sala de aula, nesses dias a sala de aula foram a rua, o auditório da URCA, as visitas em creches e escolas.
O bem material é o compromisso do prefeito em fazer um Plano de Recomposição Salarial e retomar a negociação do projeto de cumprimento de 1/3, com uma comissão composta por 20 representantes eleitos pela categoria.
Não é a mesma comissão formada para o estudo da Lei 26. Tem prazo de ação e de materialização e é composta por aqueles que os professores indicaram sob o critério básico de que o integrante estivesse participado dos 3 dias de paralisação. Na próxima terça-feira haverá uma reunião de modo a se organizar um calendário para cumprimento da recomposição salarial.
É bom frisar que enfrentaremos o discurso corriqueiro de que não há dinheiro, que é preciso cumprir a lei de responsabilidade fiscal e tantas outras justificativas que estamos acostumados a ouvir. Mas, o mais importante é mantermos a categoria unida porque é com essa união e organização que conseguimos a abertura de uma negociação.
Professor, a aula deve continuar para além da grade curricular! Sindicalistas e dirigentes sindicais, a ação de vocês é na formação política do funcionalismo e isso significa visitas constante às unidades e cursos sobre os direitos e politização do trabalhador buscando integração da classe trabalhadora, no qual o senso de coletividade deve imperar a questão individualista! Estudantes, continuem a levantar suas demandas e a compor forças para um outro modelo de sociedade! Diretores e coordenadores, sensibilizem com a causa, pois a causa é de todos!
O saldo foi positivo! Mostramos que Poços de Caldas tem paralisação sim e que ao criarmos esse histórico a tendência são conquistas cada vez maiores.

Professora Ana Paula Ferreira
mar/2016

Chico Rei na avenida

O bloco Afro Chico Rei não é de hoje que saí no carnaval. Com uma história larga e profunda se insere nas atividades carnavalescas para apresentar através da arte suas demandas, trazendo um raio X das dores e percalços de um povo.
Contudo, esse ano teve um fato peculiar. Um dos movimentos sociais mais antigos da cidade teve o apoio de outros grupos sociais, grupos esses que aprendem com a história e o legado do Centro Cultural Afro Brasileiro Chico Rei.
Esse legado está atrelado à escravidão. Foram quase 400 anos desse regime extremamente opressor, mas, foram também quase 400 anos de luta pela emancipação. Portanto, temos um patrimônio de luta com o grupo mais marginalizado do Brasil. E Poços de Caldas recebeu também a extensão dessa história com o Chico Rei que remonta desde o ano 1963.
 Inicialmente foi organizado em formato de clube e no decorrer do tempo foi trazendo uma conotação mais política e de reflexão a respeito dos vários problemas sociais que infligiam à população negra: o genocídio do povo negro, grande índice de analfabetismo e de desemprego, desvalorização de sua cultura, preconceito, racismo, baixa representatividade política... Todos esses elementos evidenciando que a pobreza no Brasil tem cor.
Aprendemos com a história que nos é deixada e por isso não podemos nos furtar de participar em comunhão das atividades que um grupo mais experiente tem a ensinar. Desse modo nesse ano, saíram no carnaval grupos mais novos de estrada, tais como a Educafro (desde 2003 em Poços de Caldas) que também tem uma ligação com a causa negra e os Coletivos de Educação e Feminista Jaçanã Musa dos Santos (ambos criados em 2015).
Isso mostra força, mostra que a demanda de um é demanda de todos, porque num cenário que as mulheres são oprimidas, entre as negras a situação é mais violenta ainda; diante de uma educação sucateada há grupos que são mais excluídos dos bancos escolares; perante a má remuneração dos professores há que se lutar pelo apoio de todos da sociedade para que essa realidade se transforme, tendo em vista que lutar por uma educação de qualidade é uma forma de conquista de um capital cultural que pode contribuir para mudança social.
A apresentação do C.C.A.B. Chico Rei na avenida não veio com a conotação de caricato, qualidade essa atribuída aos blocos. Levou o caráter de luta! Não veio com aspecto meramente de folia, mas de crítica. Mulheres vestidas com a figura da feminista Frida, trazendo o tom do empoderamento. Professores e militantes da educação carregavam um quadro negro ressaltando entre outras questões o salário baixo para que autoridades sentadas confortavelmente em seu palanque pudessem ver. Representava-se a beleza misturada com o incômodo aliando a cultura carnavalesca com a crítica.
C.C.A.B. Chico Rei nos ajudou a escrever essa história. Que possamos perpetuá-la e continuar cantando “Somos luta e inteligência, somos história e persistência, Chico Rei é resistência!”


Ana Paula Ferreira
fev/2016

Cumprimento do 1/3 e recomposição salarial

A lei 11.738 foi promulgada em 2008 e ainda não foi efetivada no município de
Poços de Caldas. É interessante notar que embora essa lei prescreva sobre o valor do piso de R$ 1968,30 e sobre o 1/3 fora de sala de aula, a administração pública, mediante pressão do ministério público, quer responsabilizar-se apenas ao que se refere à carga horária extraclasse.
            A prefeitura se utiliza da seguinte defesa: na lei está que o piso será para uma jornada de “até” 40 horas. Ora, optando pelo não investimento com os profissionais da educação, o município se arma da justificativa de que o piso já estaria sendo pago uma vez que o salário de um professor iniciante é de R$ 984,15 para 20 horas semanais. O absurdo nessa interpretação é que se a lei para “piso” não deveria haver proporcionalidade, afinal piso é o valor mínimo.
O detalhamento para superação da dúvida e da ambigüidade do termo veio com o parecer 18/2012 do Conselho Nacional de Educação (CNE) no qual explicita que a ideia de piso é de forma a não extrapolar 40hs semanais e o valor salarial seria proporcional em relação à carga horária. De acordo com o parecer: “O que a lei afirmou é que o piso salarial nacional é igual a R$ 950,00 mensais (valor da época da publicação da lei), pago como vencimento (ou seja, sem que se leve em conta as gratificações e demais verbas acessórias), por uma jornada de até 40 (quarenta) horas semanais (proporcional nos demais casos), sendo que essa jornada deve ser cumprida de modo que, no máximo, 2/3 (dois terços) sejam exercidos em atividades onde há interação com os estudantes.”
            O problema é que quando a prefeitura busca cumprir o tempo extraclasse aumentando o tempo de 20hs semanais para 30hs, sem aumentar o salário docente além do proporcional às horas a mais trabalhadas, obriga que professores que tenham dois cargos na CLT escolham um dos dois, de modo que a soma não ultrapasse a quantidade máxima de horas trabalhadas por semana.
            Enquanto professora anseio e defendo que professores não precisem se sacrificar em vários períodos. Essa sobrecarga se reflete posteriormente em uma série de problemas, como por exemplo, problemas de saúde desses trabalhadores, problemas com reposição de profissionais haja vista o sintomático número de professores que faltam, problemas na educação porque o profissional se vê sem tempo hábil para formação continuada ou acompanhamento das novas produções científicas e teóricas.
            A lei 11.738/2008 vem com esse propósito de possibilitar que o professor não precise se desgastar com inúmeras turmas.  O Conselho Nacional de Educação sugere a partir da leitura da lei, que ao garantir o 1/3 fora de sala de aula, o profissional tenha tempo para o preparo teórico, além de mantê-lo próximo da comunidade escolar, conhecendo-a a fundo e tendo mais condições de metodologias concatenadas com o grupo atendido.
            Contudo, para se fazer a opção de se trabalhar apenas um período de modo a concretizar o objetivo de uma dedicação exclusiva a determinada escola é IMPRESCINDÍVEL um salário que possibilite ao trabalhador da educação condições dignas que não precise de uma jornada de mais de 8 horas diárias.
            Infelizmente, não é o que ocorre em Poços de Caldas. Um professor em início de carreira recebe apenas 24,89% a mais que o salário mínimo, embora o FUNDEB tenha aumentado o repasse nos últimos anos esse valor não serviu para agregar nosso salário.
            De acordo com a 2° proposta dos órgãos gestores é que em dezembro de 2017 o docente da Educação Básica receberia R$ 1514,17 para 22:30 na escola e 5:30 em casa. Parece um avanço, mas não é. Segundo a proposta indecorosa, o salário de R$ 1514,17 seria pra daqui 2 anos!!!!! “Esqueceram” das perdas salariais, de todos esses anos que o professor não teve aumento além do repasse inflacionário (lembrando que tivemos ano que nem isso tivemos), “esqueceram” da valorização docente como forma de se melhorar a educação, “esqueceram” de que para se ampliar a jornada, muitos professores terão que escolher por um dos cargos, mas para completar a renda sucateada um número significativo de profissionais da educação continuarão vendendo cosméticos, bombom ou roupa, refletindo em uma diminuição do tempo destinado ao estudo e na relação teoria e prática na educação.
            Cabe lembrar que essa mudança não interferiria bruscamente na vida cotidiana do professor que só tem um cargo, afinal boa parte do trabalho seria realizado fora da sala de aula, tal como já fazemos, porém, remunerados para isso. Contudo, precisamos ter o sentimento de categoria e lembrarmos que muitos de nossos companheiros de profissão possuem dois cargos.
É um desrespeito a administração de Poços pedir que os professores abdiquem de um de seus cargos sob a justificativa de pensarem no coletivo e não em si próprios. O coletivo “comunidade escolar” deve ser valorado, mas coletivo “professores” não pode deixar de ser contemplado. E certamente por esse sentimento de “tia”, de docilização da profissão docente que o sentimento de luta, de pressão, de embate foi se perdendo. Lutar por melhorias na profissão é mostrar para os estudantes que quando falamos em cidadania não estamos apenas com uma postura “blablazante”, de quem muito fala e pouco faz.
            Na reunião do dia 21 de agosto o prefeito, com uma cordialidade de colonizador português, concordou com as professoras e disse que o salário não era o merecido pela categoria, mas que ele lidava com situações concretas e não com coisas intangíveis. É uma pena ouvir isso! Porque nós educadores lidamos com o concreto da sala de aula e com a utopia de ver mudanças. Porque também políticos são cargos públicos e como tais devem zelar pelo cumprimento dos direitos públicos. Isso significa ter respeito pela situação material, mas com planos e projetos em longo prazo, pensando em atender as demandas populares.
Digo isso porque no ano de 2013 houve uma manifestação do sindicato com significativa expressão dos trabalhadores e o prefeito, com poucos meses de posse,  desceu as escadarias para falar com todos, manifestando interesse em aumento salarial, mas alegando que o caixa da prefeitura estava com finanças extremamente preocupantes. Na hora, eu com a leitura de que ele tinha acabado de assumir a função, ainda falei ao próprio que seria importante ele montar um quadro com datas para os repasses, de forma que gradativamente o servidor conseguisse observar a conquista dos ganhos salariais, congelados durante administrações passadas.
            Ao ver que dois anos e meio se passaram e essa planilha ainda não foi feita, realmente noto que o senhor prefeito lida apenas com situações concretas. Qual concretude da parte dos servidores o senhor precisa ver para perceber nossa insatisfação?

Ana Paula Ferreira

23/08/2015

Dia das Crianças: pra que essa data?

            Historicamente, antes de ser comemorado no restante do mundo, o Dia das Crianças foi criado no Brasil pelo deputado Galdino do Valle Filho em 1920 como uma homenagem às crianças. Essas “homenagens” não são incomuns aos grupos ditos “minorias” e por isso o Dia do Índio e da Consciência Negra, Dia da Mulher, Dia do Trabalhador. Evidencia que nosso calendário foi organizado para atender a visão hegemônica, com breves instantes de holofote para os grupos que na verdade correspondem a grande maioria, e daí um calendário que acaba privilegiando o adulto, o branco, o empresário.
            Isso é percebido quando se destina 5 a 6 dias por semana para o trabalho correspondente ao universo adulto e apenas 1 ou 2 dias para o brincar, característico do universo infantil. No quesito feriados nacionais, santos católicos, herança da nossa cultura portuguesa cristã são homenageados, enquanto entidades das religiões afro-brasileiras são execradas e a religiosidade indígena tampouco é conhecida pela maioria dos brasileiros. Há o Dia do Trabalhador para aquele cuja jornada semanal de trabalho chega por lei a 44hs semanais (superando a de 40hs nos Estados Unidos e a de 35hs na França), quantidade essa de horas destinada à empresa que não pensada pelo e para o trabalhador.
            Contudo, embora haja mais hipocrisia nessas datas do que homenagens reais não deixam de ser um momento importante para se refletir sobre políticas públicas, ações sociais e perspectivas para o grupo contemplado pela data.
            Se a data em si poderia ser um movimento de resistência frente a todo calendário opressor, ela esmorece quando é apropriada pelo setor industrial. Em relação ao Dia das Crianças, a data ganha visibilidade entre 1955 e 1960 quando a fábrica de brinquedos Estrela lançou fortíssimas propagandas com vistas ao aumento do consumo (e, consequentemente do lucro) na perspectiva de incitar o ato de presentear o público infantil.
            Por isso não é difícil associar à data as diversas propagandas da indústria de brinquedos e muito pouco se vê programas de TV que abrem espaço para um panorama da infância no Brasil. Noticiam festas realizadas em alguma cidade com recreações e doces, mas não se faz um debate nos bairros sobre os Direitos das Crianças, Declaração de 1959 (Unicef/ONU), e uma reflexão com os moradores do que falta para essa Declaração ser atendida em sua plenitude. As escolas organizam gincanas e brincadeiras (como se no resto do ano não fossem necessárias), mas não se escuta nenhuma delas chamar o Conselho Tutelar ou órgão competente para conversar com os pais sobre os direitos e deveres das crianças.
            Fica subtendido que a data é para comprar o tablet que a filha tanto deseja, que é para levar o menino na Rua de lazer, que é para a criança apenas se divertir na escola, pois logo voltará o clima das aulas convencionais e sem brincadeiras.
            Assim a sociedade prossegue com pequenos regalos aos pequenos, mas que não alteram a condição da maioria... prossegue com meninos e meninas que não foram presenteados nos Dias das Crianças porque não possuem área e espaço público de lazer, porque precisam trabalhar, porque são perseguidos ou mortos por policiais, porque são vítimas de políticas truculentas de imigração, porque sofrem desde cedo as mazelas da desigualdade social.
            Que continue a data! Mas que possamos ressignificá-la e trazer o aspecto da luta, da denúncia, dos cuidados, da cobrança, das reivindicações, dos modos de se conceber a infância, a educação, a escola, de modo que a consolidação dos Direitos das Crianças seja o verdadeiro presente para as crianças.


Ana Paula Ferreira
out/ 2015

Educafro: retrospectiva 2015

O curso pré-vestibular comunitário de educação para a camada popular e afrodescendentes – Educafro – está no município de Poços de Caldas há mais de 10 anos e esse ano de 2015 continuou seu histórico de luta. 
            Educafro existe porque o Ensino Superior embora com vários avanços ainda é um espaço de poucos. Por isso, a Educafro persiste para possibilitar que estudantes de escolas públicas tenham mais condições conceituais para se inserirem nas faculdades públicas ou privadas. Porém, é importante frisar que a Educafro não se faz apenas como cursinho pré-vestibular. É antes de tudo um movimento social.
            O grande ranço que separa os que passam no Enem e os que não têm nota suficiente para cursar o Ensino Superior é um reflexo de um abandono da escola pública e em contrapartida de uma desigualdade de renda absurda que torna possível que apenas a elite se alimente do saber historicamente construído e tenha mais oportunidades de se servir dos meios universitários mais conceituados. É nesse cenário que a Educafro se inscreve: se por um lado busca contribuir para inserção da classe trabalhadora enquanto estudantes universitários, por outro questiona esse modelo econômico que transforma a educação como moeda de troca.
            Por isso, além das aulas convencionais, há a aula de Cultura e Cidadania. Por isso que no decorrer do ano participa de inúmeras ações que demonstram a indignação com os problemas sociais. Esse ano de 2015 não foi diferente.
Começamos em março em parceria com o Instituto Moreira Salles e com o grupo que luta pela igualdade de gênero “Moça Você é Machista” para apresentação de um documentário e discussão a respeito do tema aborto. Longe de uma abordagem moralista, religiosa e fundamentalista, buscou-se um olhar não tão divulgado pela grande mídia: a questão da saúde pública, ao se pensar em milhares de mulheres que anualmente morrem vítimas de abortos clandestinos e de uma sociedade patriarcal.
            No dia 1° de maio fizemos uma panfletagem e conversa com os trabalhadores sobre a PL 4330, que roga sobre a regularização das terceirizações do trabalho. No fim do mês, em parceria com a UEMG, realizamos o I Seminário da Mulher Negra com a problemática da desigualdade de gênero e os impactos ainda maiores quando se trata da mulher negra, maior vítima de abuso sexual, desemprego e subempregos; inferiorizada por uma sociedade de consumo que deprecia sua pele, seu cabelo, sua cultura. 
            Em parceria com a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) participamos de arrecadações de produtos de higiene e livros para as detentas da cadeia de Poços de Caldas, que se encontram em situação de carência em relação a esses produtos.
Participamos junto com outros grupos da Marcha contra a Intolerância Religiosa, Contra o Genocídio do Povo Negro e Contra a Violência em Relação à Mulher. Realizamos o encontro entre núcleos da Educafro de Minas Gerais que teve o privilégio de receber Frei David, fundador da Educafro e uma liderança de destaque nacional em relação à igualdade racial.
            Em setembro, em parceria com o Coletivo Educação, organizamos a palestra do professor Carlos Rodrigues Brandão, que fez uma fala sobre educação popular e Paulo Freire no espaço cultural da Urca para mais de 500 pessoas. 
Enfim, nossa luta foi em diversas frentes, em relação aos grupos mais vulneráveis, o negro, a mulher, a presidiária, o trabalhador, buscando superar o discurso blablazante e a ação vazia, desconectada de reflexões profundas, apontando para uma tentativa de se fazer a práxis, entre o estudo e a prática, a teoria e o agir sobre o mundo, aproveitando-se do saber como um processo de denúncia e de grito.
            Continuemos na luta em 2016!
           
Ana Paula Ferreira
jan/ 2016


Engajamento pela escola pública de qualidade

É comum o chamado “Venha ser um amigo da escola” e o problema disso são dois principais. Primeiro porque ausenta da responsabilidade quem é de direito, ou seja, o Estado. Segundo, porque é um discurso midiático, que longe de ansiar o desenvolvimento da educação pública de qualidade, tem como causa primeira o desconto de uma série de impostos ao direcionar esforços de arrecadação de fundos para educação. Diminui seus impostos e ao mesmo tempo aumenta sua popularidade perante um grande público.
            As grandes empresas observaram que não basta uma educação diferenciada entre ricos e pobres, entre escola particular e escola pública. É preciso intervir no currículo para se iludir sobre a boa imagem do mundo dos negócios, do capitalismo social, da formação de professores e alunos para que obedeçam o receituário neoliberal. Não quero dizer com isso, que devamos descartar essas iniciativas. Que as usemos e as ressignifiquemos ao nosso favor, mas principalmente, que além da entrada da empresa na escola, entre substancialmente a militância.
            Militância que se faz por movimentos sociais ou por cidadãos comuns que acreditam num modelo de sociedade que alie diversidade e ao mesmo tempo igualdade de oportunidades independente do movimento em que atuem.
            Por isso, a escola deve abrir suas portas para militantes da causa negra, pela igualdade de gênero, da inclusão, da sustentabilidade, da proteção aos animais, dos Direitos e Deveres da Criança e do Adolescente, e diversas causas sociais. Além disso, é fundamental para um trabalho democrático e participativo o prestígio ao trabalho dos professores, a valoração do protagonismo das crianças, dos jovens e da própria comunidade, pois há muita gente que pode ajudar com seu trabalho e sua experiência.  Sob essa responsabilização tem-se a possibilidade de demonstrarem talento e exercitarem a habilidade de trabalhar em coletivo, contribuindo em diferentes frentes, aumentando o sentimento de pertencimento em relação à unidade escolar e potencializando a responsabilidade ao perceberem de que a escola é de todos da comunidade.
            A escola agradece! Os estudantes agradecem!
           

Ana Paula Ferreira
out/ 2015

A fabricação de máquinas de xerox na escola

“Eu dei cópia e ele não quis fazer!”, “Criança precisa copiar para aprender”, “Dou cópia para treinar a caligrafia”, “O menino precisa copiar para registrar a matéria”... Esses são alguns dos dizeres sobre cópia dentro do universo escolar embutidos de enorme senso comum que já deveria ter sido superado pela formação em nível Superior que é exigida para formação da maioria dos docentes.
É engraçado pensarmos que boa parte dos professores compreende e até afirma que as crianças aprendem fazendo uso de todos os sentidos, e que muitas vezes um sentido é mais aguçado do que outro. Entretanto, a sala de aula é configurada de tal forma que o copiar é privilegiado sobre o fazer e o silêncio é a ordem dominante sobre o falar. Há uma predominância do auditivo e do visual sobre os outros sentidos.
A criança não aprenderá mais ao copiar. Enquanto copista ela realiza um serviço pior do que qualquer máquina de Xerox e se indagada sobre o que copiou dificilmente conseguirá falar sobre o assunto. Em tempos de fácil acesso tecnológico informatizado, a necessidade de copiar usando grafite e papel é menor ainda. Com um simples gesto de CTRL C e CTRL V a criança realiza a cópia do trecho selecionado. Isso significa que leu, compreendeu, interpretou, ressignificou? Não! E daí uma das causas sérias do analfabetismo funcional, no qual alunos após passarem anos na escola ainda não detém a compreensão do código escrito.
A caligrafia precisa ser bem apresentada até o 3° ano. Mostrar como é o traçado correto é uma das formas de cumprir a finalidade da letra cursiva: poupar o tempo da escrita diante da agilidade em se traçar esse tipo de letra. Mas, até mesmo a permanência do ensino da letra cursiva dentro do currículo é questionável, mas não vou me ater nesse momento.
Suponhamos que em séries mais avançadas ainda não houve a devida apropriação do traçado correto ao ponto de ser uma escrita ilegível. O professor deve fazer a intervenção mostrando a diferença entre o que o aluno faz e a maneira correta, pois acreditar que cópias simplesmente irão desfazer o erro é ilusão!
O registro da matéria pode ser de diferentes formas: resumo, organização por tópicos, mapa mental, tabelas, poesia etc. Inicialmente, quando o aluno ainda não domina esses modelos de estruturação do conhecimento, o professor deve ser o escriba, mas sempre sinalizando como se faz, buscando a participação dos estudantes. Assim que vão se familiarizando, o professor deixa de ser o interventor e passa a ser mais o mediador, orientando as produções, avaliando, oferecendo um retorno para que os educandos entendam o que precisam melhorar.
Sim! Dá mais trabalho! As escritas não serão iguais, pois não será uma linha de montagem de registro, porém, diante da necessidade de ler, reler, organizar a escrita, melhorar a caligrafia pra ser lido, contribuirá para a autonomia e para a emancipação. Evitaremos de formar pseudo-cidadãos que reproduzem o discurso da grande mídia, que repetem a rotina, o senso comum, a vida, sem questionar, conformados que estão na grande cópia de tudo.
Por isso, deixemos de produzir máquinas xerográficas de pouca qualidade para produzirmos pessoas que pensam.

Ana Paula Ferreira
23/02/2016

Paralisação e movimentação

O medo nos paralisa. Mas, não nos libertamos sozinhos do medo. Unimos com aqueles que possuem ou já possuíram a mesma insegurança e atacamos a chaga a partir do momento que compartilhamos experiências, ultrapassamos dúvidas, vencemos as inverdades.
Vários de nós professores ficaram paralisados com as pressões externas e essas não foram poucas e basta citar algumas. Uma jornalista que praticamente induz que uma entrevistada repita seu discurso desqualificando o movimento grevista; um apresentador e também vereador que chama a paralisação de “abusiva” quando um professor em início de carreira tem vencimentos de R$ 984,15; uma secretaria de educação que alega que a paralisação é injustificável porque o executivo buscou um acordo e a categoria que não aprovou, mas não menciona que o projeto teve parecer contrário inclusive da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça da Câmara).
Embora tenhamos todo esse cenário de falsas acusações, constrangimento e às vezes até o desconto em folha de pagamentos, lembremos que o NÃO nós já temos.
Na condição de professores da rede municipal de Poços de Caldas o NÃO está presente em relação à negativa do aumento salarial, no não cumprimento do 1/3 fora de sala de aula, na negligência às alterações do Plano de Carreira, nos 12 anos sob várias gestões que não forneceram aumento real, fazendo com que nosso salário de magistério corresponda a 46% do piso nacional.
Nós, professores da rede estadual convivemos com o NÃO, quando não há o cumprimento de acordo assinado pelo governador se propondo a nomear os concursados, quando não repassa progressivamente o valor para que se atinja o piso nacional, ou quando desconsideram nossas demandas de menos alunos por salas de aulas, as quais podem beirar 50 estudantes.
O NÃO que temos hoje talvez vire SIM amanhã.
Contudo, só há a possibilidade de mudança com movimento e por isso quando dizemos PARALISAÇÃO é dos estabelecimentos de ensino, não é de pessoas muito menos de mentes.
Paralisar significa parar a escola e chamar a atenção de todos sobre a situação da educação. Significa ir além das lamúrias da hora do intervalo e partir para ação. É um dos ritos de passagem entre ser “tia” e transformar-se em professora. É dar aula de cidadania nas ruas.
Por isso exige coragem, princípio de coletividade, espírito de inconformismo, paciência no diálogo com colegas que são tímidos ou avessos a esta movimentação.
Para sair do NÃO e adquirir uma proposição no SIM em relação às nossas demandas, lembro do grupo pernambucano Siba e Fuloresta “Toda vez que eu dou um passo o mundo saí do lugar”.
Eu também quero que o mundo saia do lugar. Comecemos pela paralisação do medo e pela movimentação da esperança!

Professora Ana Paula Ferreira   
17/03/2016
    

Por que resultados pífios em Educação?

Na última semana foram divulgados os resultados da Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) pelo Ministério da Educação (MEC) e os dados não são dos melhores... Os dados da avaliação são referentes a 2014 colhidos junto a alunos de 8 anos, do 3º ano do Ensino Fundamental, que apresentaram o seguinte desempenho: 1 em cada 5 alunos não consegue ler e compreender corretamente um frase e na Matemática o resultado é ainda pior, uma vez que 57% dos estudantes possuem desempenho insuficiente.
            É comum nesses casos a culpabilização dos ciclos ou da Progressão Automática, no qual se alega que os alunos passam ser ter domínio do conteúdo. Porém, é interessante notar que em meados dos anos 80, antes do ciclo na educação brasileira, para cada 1000 crianças apenas 1/5 concluía o Ensino Fundamental. Além disso, o Brasil fechou o século XX ganhando o título de país com o maior índice de repetência, o que não se reflete em educação de qualidade, mediante pesquisa de competência de leitura, matemática e ciências, na qual o Brasil ficou em penúltimo lugar entre 41 países participantes. Isso mostra que independente da adoção da progressão automática ou um sistema mais rígido de retenção há a produção de uma massa de marginalizados, seja pelos analfabetos funcionais que perpassam toda Educação Básica, seja através dos que repetentes que acabam por tomar a via da evasão.
            Nesse sentido, a escola organiza-se como um lugar de distinção, no qual só é privilegiado o estudante que já detém o capital cultural afinado com o capital escolar. Dessa forma, avaliações seguem para taxar, categorizar do que para ser uma mão de via dupla: o que o aluno aprendeu e o que precisa avançar, e o que essa prova indica sobre a metodologia do professor, onde são necessários os ajustes.
            Alguns então devem pensar que a questão está em investimento. Sim, estamos vivenciando um período de crise econômica, evidente no corte de gasto em educação nos últimos meses (PNAIC, PRONATEC, financiamento estudantil), mas nos últimos anos houve um avanço no investimento na mesma área, com aprovação inclusive no ano passado de utilização de 10% do PIB para Educação. Pode-se perceber os investimentos na expansão do Ensino Superior e dos cursos técnicos e a realização nos anos de 2013 e 2014 do PNAIC, em que professores que lecionavam até 3º ano do Fundamental tiveram um curso de formação com recebimento de bolsa pela participação, material de apoio e livros de leitura para cada sala de aula.
            Contudo, várias notícias apontam o quanto a educação pública ainda não está bem equipada. Se entendermos que a União é responsável pelo Ensino Superior, os Estados pelo Ensino Médio e os municípios pelo Ensino Fundamental veremos o porquê da diferença de escolas tão sucateadas nas áreas mais pobres do país. Enquanto nos últimos anos o Ensino Superior teve um investimento de quatro vezes mais que a Educação Básica essa muitas vezes contou com recursos irrisórios de seus municípios o que se reverte nos números dos resultados das avaliações nacionais.
            Isso porque os índices mostram que regiões com indicadores sociais ruins e com alto índice de crianças que trabalham possuem o pior desempenho. Isso é uma amostra que não adianta somente investimento em educação, mas investimento em outras áreas e por isso os ministérios devem traçar estratégias de ação em diálogo, pois sozinha a educação não muda o quadro de desigualdade econômica, nem tampouco cultural.
            Em termos de políticas públicas faltam inserções mais profundas para que o professor receba um salário digno que o possibilite trabalhar menos e ter mais tempo para sua formação teórica, o que se refletirá no ensino mais embasado na sala de aula. Afinal, como o professor irá elaborar planos mais inovadores com tão pouco tempo livre? Ainda em relação aos docentes faz-se também imprescindível a formação inicial e continuada de modo que estejam preparados para lidarem com novas tecnologias, com o raciocínio matemático, com a inclusão, com a leitura não mecânica e vazia, mais cheia de sabores e cores, cultura e vida.
Bem, se por um lado temos necessidades urgentes de uma política que dialogue a educação com demais esferas, também a escola deve lembrar que “a educação sozinha não transforma, sem ela tampouco a sociedade muda”. Dessa forma, a escola ao se fazer democrática e com trabalho coletivo, pode aproveitar de seu grau de autonomia e convidar a comunidade para participar da elaboração curricular da própria escola, de modo que o ensino esteja mais próximo da realidade dos alunos e não como mero exercício técnico e repetitivo. Por um lado a escola ganharia com um ensino que obrigaria pais, professores e alunos a pesquisar de acordo com as demandas, ousando em criatividade e produção do saber concatenado com a valorização do conhecimento local. Por outro a comunidade encontraria na escola o espaço para refletir e pontuar ações de interesses da coletividade. Textos ganhariam um sentido maior de serem produzidos como mecanismo de denúncia das situações de opressão e a leitura teria o significado de entender para intervir na realidade. Que viva essa esperança de formar um número cada vez maior de leitores proficientes e estudantes com conhecimento pertinente ou além da série, mas, sobretudo, uma lição de educação em que a escola fala “presente” na aula de cidadania.

Ana Paula Ferreira
21/09/2015

O projeto Político Pedagógico da escola e seu currículo: sua grande autonomia

A escola enquanto instituição social não se isola territorialmente. Além de possuir janelas e portas com possibilidade de receberem novos ares, compreende também pessoas que transitam em seu ambiente e que carregam em si a marca da onde vieram, da onde falam, da onde pensam.
            Devido a essa condição de pertencimento à sociedade, a escola cumpre o papel que lhe é exigido por leis, parâmetros, referencial curricular. Isso é uma forma de se organizar politicamente a escola, minimizando as contradições regionais, sociais, econômicas, em busca de coordenadas gerais no qual a escola se torne um espaço propulsor nas discussões das demandas de uma nação. O sociólogo Florestan Fernandes já sinaliza essa importância da instituição escolar, associada a um plano social, que na visão desse teórico ela deveria atingir altos patamares de racionalização através das disciplinas curriculares e ainda uma consciência cívica de modo que a população pudesse participar cada vez mais das decisões políticas. Como disse uma vez em entrevista "Um povo educado não aceitaria as condições de miséria e desemprego como as que temos".
            O problema é que na atual conjuntura de um Estado que segue ditames do capitalismo, das leis do mercado, a escola é vista como espaço pragmático e utilitarista, devendo formar quadros de trabalhadores.  O espaço escolar é invadido por esse paradigma e esse é um reflexo nefasto porque lhe retira a condição da própria origem da palavra “escola”, que em grego quer dizer “lugar do ócio”, no sentido de ocupar o tempo livre com criatividade, discussão de temas e assuntos, estudo e se contraporia a ideia de ‘negócio’, que etimologicamente quer dizer negar o ócio.
            Não é a toa que a escola imita a fábrica com seus apitos (opa, sinais), com seus muros altos, com a compartimentação de salas de aula e profissionais (professores) especialistas que pouco dialogam com as outras áreas. Aula no pátio é coisa rara (a não ser pelo professor de Educação Física), aula com projetos é visto como ineficiente, afinal não trabalha as perguntas e respostas da Prova Brasil, aula com jogos é ainda associada a “passar o tempo”.
            O ruim é que talvez por desconhecimento, talvez por ser mais cômodo, toda escola tem seu grau de autonomia curricular legitimado por lei e que raramente é utilizado consoante ao Projeto Político Pedagógico. Refiro-me ao artigo 26 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB9394/96) que garante a cada estabelecimento de ensino sua estruturação curricular assentada na discussão com a comunidade escolar.
            Assim, há um programa curricular nacional, o hegemônico, o que estimula em linhas gerais o que é necessário que todos aprendam. Entretanto, é também possível que cada escola faça seu próprio currículo, partindo do senso comum da localidade, dos saberes populares, da história e do conhecimento microrregional e dialogando com o mundo, com a sociedade, através de uma participação com os profissionais da educação, alunos e familiares.
Quando digo profissionais da educação estão subtendidos não somente os professores e a direção, mas inclusive as merendeiras, cuidadores, pessoal da secretaria e da limpeza, lembrando que todos em suas atividades acabam por educar e possuem um público que é específico e precisam, portanto de participar do plano da escola. Em relação aos familiares, é sabido que a criação de uma participação cada vez mais profunda com a comunidade é um desafio para boa parte das instituições escolares, mas é um dever democrático buscar essa inserção dos responsáveis diretos pelos alunos nos debates e nas definições do currículo escolar.
Dessa forma, a escola usará suas portas e janelas para entrar não somente leis e pessoas, mas ideias, conhecimento de mundo e romperá aos poucos com a ordem capitalista que se instala na linha de produção escolar quando esta adota o mesmo currículo pasteurizado que outras escolas de realidades diferentes. Amparada na sua terra e nas suas pessoas, a escola pode pensar sua estrutura, sua filosofia, seu currículo, concatenado com seu projeto político pedagógico.
Quem sabe assim a escola deixe de ser apenas um espaço dentro da comunidade para ser um espaço de pertencimento, aliando conhecimento popular com conhecimento científico, preocupação com o saber e com uma ação social, teoria e prática, global e local.



Ana Paula Ferreira
16/10/2015