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domingo, 20 de março de 2016

Cumprimento do 1/3 e recomposição salarial

A lei 11.738 foi promulgada em 2008 e ainda não foi efetivada no município de
Poços de Caldas. É interessante notar que embora essa lei prescreva sobre o valor do piso de R$ 1968,30 e sobre o 1/3 fora de sala de aula, a administração pública, mediante pressão do ministério público, quer responsabilizar-se apenas ao que se refere à carga horária extraclasse.
            A prefeitura se utiliza da seguinte defesa: na lei está que o piso será para uma jornada de “até” 40 horas. Ora, optando pelo não investimento com os profissionais da educação, o município se arma da justificativa de que o piso já estaria sendo pago uma vez que o salário de um professor iniciante é de R$ 984,15 para 20 horas semanais. O absurdo nessa interpretação é que se a lei para “piso” não deveria haver proporcionalidade, afinal piso é o valor mínimo.
O detalhamento para superação da dúvida e da ambigüidade do termo veio com o parecer 18/2012 do Conselho Nacional de Educação (CNE) no qual explicita que a ideia de piso é de forma a não extrapolar 40hs semanais e o valor salarial seria proporcional em relação à carga horária. De acordo com o parecer: “O que a lei afirmou é que o piso salarial nacional é igual a R$ 950,00 mensais (valor da época da publicação da lei), pago como vencimento (ou seja, sem que se leve em conta as gratificações e demais verbas acessórias), por uma jornada de até 40 (quarenta) horas semanais (proporcional nos demais casos), sendo que essa jornada deve ser cumprida de modo que, no máximo, 2/3 (dois terços) sejam exercidos em atividades onde há interação com os estudantes.”
            O problema é que quando a prefeitura busca cumprir o tempo extraclasse aumentando o tempo de 20hs semanais para 30hs, sem aumentar o salário docente além do proporcional às horas a mais trabalhadas, obriga que professores que tenham dois cargos na CLT escolham um dos dois, de modo que a soma não ultrapasse a quantidade máxima de horas trabalhadas por semana.
            Enquanto professora anseio e defendo que professores não precisem se sacrificar em vários períodos. Essa sobrecarga se reflete posteriormente em uma série de problemas, como por exemplo, problemas de saúde desses trabalhadores, problemas com reposição de profissionais haja vista o sintomático número de professores que faltam, problemas na educação porque o profissional se vê sem tempo hábil para formação continuada ou acompanhamento das novas produções científicas e teóricas.
            A lei 11.738/2008 vem com esse propósito de possibilitar que o professor não precise se desgastar com inúmeras turmas.  O Conselho Nacional de Educação sugere a partir da leitura da lei, que ao garantir o 1/3 fora de sala de aula, o profissional tenha tempo para o preparo teórico, além de mantê-lo próximo da comunidade escolar, conhecendo-a a fundo e tendo mais condições de metodologias concatenadas com o grupo atendido.
            Contudo, para se fazer a opção de se trabalhar apenas um período de modo a concretizar o objetivo de uma dedicação exclusiva a determinada escola é IMPRESCINDÍVEL um salário que possibilite ao trabalhador da educação condições dignas que não precise de uma jornada de mais de 8 horas diárias.
            Infelizmente, não é o que ocorre em Poços de Caldas. Um professor em início de carreira recebe apenas 24,89% a mais que o salário mínimo, embora o FUNDEB tenha aumentado o repasse nos últimos anos esse valor não serviu para agregar nosso salário.
            De acordo com a 2° proposta dos órgãos gestores é que em dezembro de 2017 o docente da Educação Básica receberia R$ 1514,17 para 22:30 na escola e 5:30 em casa. Parece um avanço, mas não é. Segundo a proposta indecorosa, o salário de R$ 1514,17 seria pra daqui 2 anos!!!!! “Esqueceram” das perdas salariais, de todos esses anos que o professor não teve aumento além do repasse inflacionário (lembrando que tivemos ano que nem isso tivemos), “esqueceram” da valorização docente como forma de se melhorar a educação, “esqueceram” de que para se ampliar a jornada, muitos professores terão que escolher por um dos cargos, mas para completar a renda sucateada um número significativo de profissionais da educação continuarão vendendo cosméticos, bombom ou roupa, refletindo em uma diminuição do tempo destinado ao estudo e na relação teoria e prática na educação.
            Cabe lembrar que essa mudança não interferiria bruscamente na vida cotidiana do professor que só tem um cargo, afinal boa parte do trabalho seria realizado fora da sala de aula, tal como já fazemos, porém, remunerados para isso. Contudo, precisamos ter o sentimento de categoria e lembrarmos que muitos de nossos companheiros de profissão possuem dois cargos.
É um desrespeito a administração de Poços pedir que os professores abdiquem de um de seus cargos sob a justificativa de pensarem no coletivo e não em si próprios. O coletivo “comunidade escolar” deve ser valorado, mas coletivo “professores” não pode deixar de ser contemplado. E certamente por esse sentimento de “tia”, de docilização da profissão docente que o sentimento de luta, de pressão, de embate foi se perdendo. Lutar por melhorias na profissão é mostrar para os estudantes que quando falamos em cidadania não estamos apenas com uma postura “blablazante”, de quem muito fala e pouco faz.
            Na reunião do dia 21 de agosto o prefeito, com uma cordialidade de colonizador português, concordou com as professoras e disse que o salário não era o merecido pela categoria, mas que ele lidava com situações concretas e não com coisas intangíveis. É uma pena ouvir isso! Porque nós educadores lidamos com o concreto da sala de aula e com a utopia de ver mudanças. Porque também políticos são cargos públicos e como tais devem zelar pelo cumprimento dos direitos públicos. Isso significa ter respeito pela situação material, mas com planos e projetos em longo prazo, pensando em atender as demandas populares.
Digo isso porque no ano de 2013 houve uma manifestação do sindicato com significativa expressão dos trabalhadores e o prefeito, com poucos meses de posse,  desceu as escadarias para falar com todos, manifestando interesse em aumento salarial, mas alegando que o caixa da prefeitura estava com finanças extremamente preocupantes. Na hora, eu com a leitura de que ele tinha acabado de assumir a função, ainda falei ao próprio que seria importante ele montar um quadro com datas para os repasses, de forma que gradativamente o servidor conseguisse observar a conquista dos ganhos salariais, congelados durante administrações passadas.
            Ao ver que dois anos e meio se passaram e essa planilha ainda não foi feita, realmente noto que o senhor prefeito lida apenas com situações concretas. Qual concretude da parte dos servidores o senhor precisa ver para perceber nossa insatisfação?

Ana Paula Ferreira

23/08/2015

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