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quinta-feira, 6 de abril de 2023

Transporte público e o acesso à cidade

             


            Eu trabalho na zona sul de Poços de Caldas desde 2008 e uma coisa que sempre me chamou a atenção era o hábito dos alunos dizerem que gostavam de vir para a cidade. Vou repetir: gostavam de vir para a cidadeNão falavam para o centro da cidade. É como se diante da distância de 8 quilômetros não se considerassem pertencentes a Poços de Caldas ou se sentissem estrangeiro na própria terra.

Mas é compreensível esse tipo de pensamento, afinal a história da nossa cidade com seus balneários de grande estilo arquitetônico, hotéis e cassinos de luxo, evidencia uma opulência que se contradiz com a segregação de moradores de baixa renda que foram empurrados para os bairros mais distantes, sob pressão do valor do imóvel. O problema é que essa mudança das regiões mais centrais não foi acompanhada por uma vivência num espaço acolhedor. Cabe lembrar, por exemplo, que na inauguração do Conjunto Habitacional não havia creche, nem escola, nem rua asfaltada e a falta de água era uma constância. Em linhas gerais: era um bairro que servia como um imenso dormitório urbano daqueles que trabalhavam no centro, mas não usufruíram de seus bens.

Na música “Cidadão” interpretada por Zé Geraldo, há o trecho no qual o construtor civil olha para o prédio e se lembra das dificuldades e das “4 condução, duas para ir e duas para voltar”. E nessa distância entre o produto do trabalho e o trabalhador, tentam nos fazer crer que não devemos participar daquilo que ajudamos a construir.

E isso não impacta apenas na marginalização social, a qual, diga-se de passagem, ficará pior com a privatização dos pontos turísticos. O outro impacto é a alienação. Alienação é estar alheio a algo, e pela corrente marxista é um termo utilizado para mostrar quando o trabalhador não se reconhece no próprio produto do seu trabalho, atribuindo a outros o que foi fruto do seu esforço.

Não é a prefeitura que cuida de jardins, que asfalta ruas, que limpa canos de distribuição de água. Não são construtoras que fazem edifícios. Não é o comércio que vende. Para tudo isso acontecer teve a mão do homem e da mulher, de trabalhadores muitas vezes invisíveis. É certo que há aqueles que participam mais a frente do direcionamento, da tomada de decisão, mas se não fosse a energia despendida pelos trabalhadores a cidade não teria crescimento, movimento, serviços nem nada disso.

Ora, sabendo da importância dos trabalhadores onde está a valorização dos cidadãos poços caldenses de baixa renda? Como terão acesso ao que foi produzido com os altos preços do transporte público? E isso não está acontecendo apenas no trajeto bairro/ centro, como também no acesso à escola.

É o caso da escola Padrão, que atua na região sul, uma área estimada em 60 mil habitantes. Situada no bairro Parque das Nações, a distância com alguns bairros nos quais atende, pode chegar a mais de 3 quilômetros e o problema de acessibilidade se intensifica em 2023 por falta de ônibus escolar. Isso porque até o ano passado havia uma parceria entre município e rede estadual, seguindo o disposto na Lei 10.709 de 2003, no seu artigo 3º. Porém, esse ano, diante do Novo Ensino Médio que amplia o tempo escolar, nossos estudantes não mais saem no mesmo horário que os da rede municipal, acarretando não apenas em grandes probabilidades de evasão escolar, como na insegurança de famílias, isso porque, adolescentes de 14 e 15 anos saem às 18h10 da escola.

O que estamos ensinando com isso? Que o direito à educação pode não ser acessado, pode não ser cumprido. E não estou falando de poucas famílias nessa situação, porque de acordo com respostas levantadas via formulário, há em torno de 200 estudantes que precisariam do transporte e não podem custear.

É preciso transporte público de qualidade e com tarifas mais reduzidas. É preciso a acessibilidade a bens culturais e comerciais da cidade. É preciso transporte escolar para que nossos estudantes façam o trajeto casa e escola em segurança. É preciso vontade política para defender que a cidade deve ser usufruída por todos.

Ana Paula Ferreira

Supervisora da rede estadual 


Texto publicado no Jornal da Cidade 7/04/2023




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