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sábado, 9 de julho de 2016

Criar a sede de aprender


            Quando uma escola tem logo nos anos iniciais alunos desinteressados pelo estudo há uma enorme ferida que é preciso curar. Pode ser que a ferida seja causada pelos tropeções entre o caminho da casa e a chegada ao universo da escola, um trajeto cultural tão distante para muitos que não estão próximos a linguagem escolar. Pode ser ainda que o desinteresse seja proveniente de aulas maçantes que se contentam mais em transmitir do que compartilhar, em dar do que produzir, em registrar do que criar.
            Entretanto, sendo um diagnóstico ou outro uma medicação que faz parte da Pedagogia do Bom Senso (FREINET, 2004) é que “não se obriga um cavalo que não tem sede a beber!”.
            É preciso que ensinemos sim a técnica da leitura e da escrita, um conhecimento valioso para que os estudantes se emancipem. Porém, essa técnica não pode estar desprovida de situações que agucem a vontade de ler e de escrever. Ler e escrever são atos sociais e como tais precisam ser vividos, contemplados e compartilhados. Diante do convívio com o outro que se abre a possibilidade de se sentir amparado, ouvido, incentivado par transformar a palavra em sentido, ressuscitando-se a escrita morta para seu diálogo com a concretude da vida.
            Saraus poéticos, contação de história, jornal escolar, recitais, teatro, criação de letras de música, de regras de um jogo, assembleias estudantis... são várias as atividades que a escola incentivaria o conhecimento técnico da codificação e decodificação sem perder de vista a criação de situações que agucem a sede em aprender, em transformar, em humanizar-se pelo processo de criação.
            Sem o gosto de apropriar-se do saber ou o conhecimento se torna estéril, mero cumprimento para nota ou defronta-se com o comportamento dos resistentes que transformam a bagunça na sua arma maior.
            Adélia já dizia com a beleza poética que “Não quero a faca, nem o queijo. Quero a fome.” Comparando com nosso propósito de ensino da leitura e da escrita, não basta dar a faca, ou melhor, o instrumento, que no caso presente é a técnica da grafia e da transformação dos grafemas em fonemas. Não basta tampouco dar o queijo, comparado aqui ao objeto em si, o texto, o livro, o conhecimento em geral. A fome precisa ser instigada e para isso a comida, o saber, precisa estar apetitoso, colorido, com aroma agradável, com toda uma propaganda de quem provou e se deliciou.
O desafio do educador esta aí! Porém, dentre os presentes que mais lhe preenchem a alma de alegria não é o mérito do bom aluno com ótimas notas, mas ver, por exemplo, os mais arteiros ou os que possuem mais dificuldades, segurando um livro de poesia na mão, ensaiando uma leitura antes de expô-la num sarau.


Ana Paula Ferreira


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