Quando uma escola tem logo nos anos
iniciais alunos desinteressados pelo estudo há uma enorme ferida que é preciso
curar. Pode ser que a ferida seja causada pelos tropeções entre o caminho da
casa e a chegada ao universo da escola, um trajeto cultural tão distante para
muitos que não estão próximos a linguagem escolar. Pode ser ainda que o
desinteresse seja proveniente de aulas maçantes que se contentam mais em
transmitir do que compartilhar, em dar do que produzir, em registrar do que
criar.
Entretanto, sendo um diagnóstico ou
outro uma medicação que faz parte da Pedagogia do Bom Senso (FREINET, 2004) é
que “não se obriga um cavalo que não tem sede a beber!”.
É preciso que ensinemos sim a
técnica da leitura e da escrita, um conhecimento valioso para que os estudantes
se emancipem. Porém, essa técnica não pode estar desprovida de situações que
agucem a vontade de ler e de escrever. Ler e escrever são atos sociais e como
tais precisam ser vividos, contemplados e compartilhados. Diante do convívio
com o outro que se abre a possibilidade de se sentir amparado, ouvido,
incentivado par transformar a palavra em sentido, ressuscitando-se a escrita
morta para seu diálogo com a concretude da vida.
Saraus poéticos, contação de
história, jornal escolar, recitais, teatro, criação de letras de música, de
regras de um jogo, assembleias estudantis... são várias as atividades que a
escola incentivaria o conhecimento técnico da codificação e decodificação sem
perder de vista a criação de situações que agucem a sede em aprender, em
transformar, em humanizar-se pelo processo de criação.
Sem o gosto de apropriar-se do saber
ou o conhecimento se torna estéril, mero cumprimento para nota ou defronta-se
com o comportamento dos resistentes que transformam a bagunça na sua arma
maior.
Adélia já dizia com a beleza poética
que “Não quero a faca, nem o queijo. Quero a fome.” Comparando com nosso
propósito de ensino da leitura e da escrita, não basta dar a faca, ou melhor, o
instrumento, que no caso presente é a técnica da grafia e da transformação dos
grafemas em fonemas. Não basta tampouco dar o queijo, comparado aqui ao objeto
em si, o texto, o livro, o conhecimento em geral. A fome precisa ser instigada
e para isso a comida, o saber, precisa estar apetitoso, colorido, com aroma
agradável, com toda uma propaganda de quem provou e se deliciou.
O desafio do educador esta aí! Porém,
dentre os presentes que mais lhe preenchem a alma de alegria não é o mérito do
bom aluno com ótimas notas, mas ver, por exemplo, os mais arteiros ou os que
possuem mais dificuldades, segurando um livro de poesia na mão, ensaiando uma
leitura antes de expô-la num sarau.
Ana Paula Ferreira
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