A peça teatral
“Saltimbancos” de Chico Buarque está mais atual do que nunca. Não digo pelo
fato da nova versão de filme que estreou em janeiro deste ano tendo Renato
Aragão como protagonista. A atualidade reside na discussão do desmonte dos
direitos trabalhistas que está ocorrendo nos últimos meses no Brasil e que o
texto “Saltimbancos” metaforicamente trata tão bem diante de seus animais.
A história começa com
um jumento que foge para não continuar sofrendo as opressões do campo, representando
o trabalhador rural que abastece a zona urbana, mas nem é lembrado, “nem nome
não tem”. Fazendo um paralelo com a atual conjuntura, o trabalhador rural não é
somente esquecido pelos citadinos, como também pelos próprios representantes
políticos quando se corre o risco que os mesmos votem a Reforma da Previdência
na qual o camponês será duramente penalizado. Se antes tinham o direito de se
aposentarem antes da idade mínima, tendo em vista que geralmente iniciam-se nas
atividades da roça antes dos 14 anos, com a PEC 287 o capiau aposentará com a
mesma idade que outros trabalhadores. Esquecem de suas marcas de sol, de suas
mãos calejadas, de seu sono interrompido na madrugada e lhe exigem mais
trabalho, mais contribuição, mais produção e menos retorno.
O mesmo acontece com a
personagem da galinha que pode ser comparada aos operários fabris. Isso porque
passado o período produtivo, não servem mais, são corpos descartáveis e que
podem sentir mais rapidamente o pacote de mudanças trabalhistas tendo em vista
a aprovação da Terceirização para todas as atividades. As mudanças permitem uma
jornada acima de 8 horas diárias, precarização do trabalho e remunerações
abaixo do valor que seria pago caso a contratação fosse diretamente com a
empresa a qual se presta o serviço. Para garantir uma aposentadoria integral
precisará contribuir por 49 anos ininterruptos, o que significa não parar a
produção seja por motivo de desemprego, acidente de trabalho ou afins. Porém,
com a idade avançada chega também o cansaço e não se produz tanto quanto antes
e assim como a galinha da história que ao não botar mais ovos é ameaçada a
virar canja, o trabalhador industriário é ameaçado a ser demitido antes da
idade de 65 anos, ficando desempregado, com poucas chances de voltar ao mercado
e sem aposentadoria.
A violência das medidas
anti-trabalhadores refletirá pesadamente sobre a juventude que precisará
contribuir desde cedo se quiser aumentar as chances de aposentar, porém num
cenário de terceirizações em massa e com menor chance de entrada no mercado de
trabalho haja vista que o trabalhador (se respeitado seu tempo para aposentar)
demorará mais tempo para desocupar uma vaga. A juventude é ilustrada pela gata do
livro “Saltimbancos”, aquela que ainda não está na idade produtiva e que faz da
música sua forma de protesto.
Entretanto
no decorrer da história há o entendimento entre os personagens que a arte não é
suficiente como forma de ataque e percebem que a libertação de seus opressores
ocorrerá quando se unirem pois “um bico com dez unhas, quatro patas, trinta
dentes e o valente dos valentes ainda vai te respeitar”. O tom esperançoso do
livro em relação ao trabalho coletivo reforça a ideia de que para combater a
aprovação da Reforma da Previdência não bastam paralisações pontuais e faz-se
urgente uma greve geral. Somos agricultores, operários, professores, policiais
ou jovens, somos por isso mesmo classe trabalhadora. Se apenas uma categoria
mostra os dentes ou as unhas é pouco perante a força que os barões do poder
possuem e por isso é imprescindível uma bandeira de luta de que “Todos juntos
somos forte, somos flechas e somos arco, todos nós no mesmo barco, não há nada
a temer”. Se juntos, Temer jamais!
Ana Paula Ferreira
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