O dia 21 de setembro é datado como o Dia Nacional da Luta das Pessoas com Deficiência e nos possibilita pensar que escola queremos, que tipo de mundo pretendemos construir. Um filme que alarga essa reflexão e que me surpreendeu é “Corcunda de Notre Dame” dirigido por Peter Medak. Traz um Quasímodo que não era apenas a pessoa com deficiência física e de alma generosa que defende a amiga, tal qual apresentado no desenho da Disney. Era também um leitor voraz, alguém que encontra no conhecimento o poder da libertação de si e do outro e ao acreditar na propagação de uma ideia, escreveu panfletos e os distribuiu lutando por justiça.
O saber lhe deu
condições de se colocar perante o mundo, de ecoar sua voz e suas demandas, de
enfrentar barreiras para a construção de uma sociedade mais democrática. Não
estava salvando Esmeralda. Estava desafiando um sistema político extremamente
arbitrário, uma religião fechada em si mesma, e evidenciando que marginalizados
de todas as ordens poderiam se unir para colocar suas pautas.
Historicamente, vimos
que as pessoas com deficiência eram afastadas do convívio, e que, aliás, a
escolarização desse grupo é muito recente, pois, em se tratando de Brasil, se
passaram mais de três séculos para que houvesse uma instituição que olhasse
para essa demanda (Instituto dos Meninos Cegos/ Instituto de surdos-mudos) e em
relação à deficiência mental se passaram mais de 400 anos (Sociedade Pestalozzi
e APAE). Entretanto, a educação era, sobretudo em escolas especializadas,
embora a LDB de 1961 já manifestasse que na medida do possível era para ser no
Sistema Geral de ensino.
Hoje temos mais alunos
nas classes regulares por conta de todo advento de acordos internacionais,
legislações e políticas públicas que fomentaram a matrícula e o atendimento ao
aluno com deficiência. Mas, ficam duas perguntas: Em que medida essas políticas
ainda precisam avançar? E como cada profissional da educação pode materializar
a lei para que a inclusão não seja apenas mero documento?
Paulo Freire nos fala
de uma educação que seja libertadora, para professores e alunos. Para isso, preciso ir além do que é visível, além do que o texto
traz, ou do que o aluno traz. Cada aluno é um baú de passado, de experiências
guardadas, de conhecimento assimilado, mas também é um campo de futuras
possibilidades. Hoje ele não consegue, amanhã ele pode conseguir com mediação e
depois poderá conseguir sozinho. Ninguém se resume apenas ao hoje, ninguém se
resume às suas dificuldades.
Como salientou Kassar
(2011) a dificuldade da inclusão é também uma dificuldade da escola pública,
historicamente também colocada nas margens, e, portanto, lutar por educação
inclusiva é somar na luta por uma educação pública que seja de qualidade a
começar por menos alunos por sala, metodologias ativas que primem pelo trabalho
coletivo, relações mais horizontais, salário digno no qual o professor não
precisasse trabalhar vários turnos e mal conhecer sobre a comunidade das
diversas escolas que leciona.
Que inclusão deve ser
nossa bandeira? Uma inclusão que não se faça apenas do aluno com deficiência dentro
da sala de aula regular, mas que possibilite aquilo que Quasímodo sabia: que a
educação é uma ferramenta contra desigualdades e, portanto, todos devem ter
acesso a ela, na perspectiva de humanização e de aumento da participação
popular em prol de uma sociedade mais justa.
Ana Paula Ferreira
Supervisora pedagógica da rede estadual,
Mestre em Educação
Texto também publicado no Jornal da Cidade e Jornal da Mantiqueira
https://www.jornalmantiqueira.com.br/2020/09/21/opiniao-educacao-inclusiva-uma-bandeira-continua/