Estamos no mês de março e não há
como esquecer o dia internacional da mulher. A data não surgiu porque as
mulheres reivindicavam batons, flores, cartões e mensagens, mas porque lutavam
por “Pão e Paz”. Essa greve ocorreu na Rússia czarista, na qual mulheres foram
às ruas contra as jornadas extenuantes, os baixíssimos salários e por condições
dignas no ambiente fabril. Ao mesmo tempo, gritavam pelo retorno de seus filhos
e esposos que estavam nas trincheiras da 1ª Guerra Mundial, diante de um governo
arbitrário num país que sucumbia a fome. Teve tamanha força essa greve do dia 8
de março de 1917 que serviu de estopim para a Revolução Russa.
Porém, a História ao longo dos
anos foi escrita por homens e por acadêmicos, pessoas letradas e fortemente
impactadas pela ideologia burguesa. Portanto, era comum que a história de mulheres,
de trabalhadores, dos mais pobres, ficasse escondida debaixo dos escombros e
ruínas, enquanto fatos e memória dos vencedores tinham o holofote das páginas
da história da humanidade.
Se quisermos hoje saber sobre a
história das mulheres, precisamos escavar boas referências e dentre elas, uma
que me chama a atenção é a historiadora Silvia Federici. No seu livro “Calibã e
a Bruxa” a autora nos conta que na transição entre a economia feudal para a
economia de mercado, diversos governos entenderam a importância do crescimento
populacional como forma de conseguir mais consumidor e mão-de-obra barata. A
consequência foi tornar a mulher como mero útero, escravizando-a no ambiente
doméstico e transmitindo um novo modelo feminino a ser seguido: dócil,
submissa, calada, resignada ao marido. As que não se sujeitavam a isso eram
consideradas bruxas e mortas na fogueira.
Ainda hoje milhares de mulheres
são mortas sob o fogo do feminicídio. Há também aquelas que são feridas em sua
integridade moral e psicológica diante das palavras de baixo calão das redes
sociais, da humilhação em público, sob a chama de palavrões e obscenidades. Os
machistas tentam incessantemente silenciar as mulheres, pois essas ainda são
concebidas como propriedade do homem, sendo inadmissível as que vão a público,
que confrontam as ideias dos poderosos, que denunciam um presidente ignóbil,
que fazem greve.
É nesse cenário que as líderes do
movimento grevista em Minas Gerais foram recebidas pelos representantes do
governo, quando sentaram à mesa de negociação. Tons de deboche, ironia,
comunicação com desdém, aumento do volume da voz, várias artimanhas para
minimizar e intimidar. Essa desvalorização profissional de mulheres que são
líderes sindicais é efeito de um país onde a desigualdade gênero é naturalizada
e cargos e funções menos valorizados são mais propagandeados ao universo
feminino sob estereótipo de que a mulher é zelosa, paciente, amorosa e,
portanto, se encaixaria mais nessas profissões sendo, portanto, absurdo aquelas
que se encaminham para a política, local de excelência do homem.
Ora, numa sociedade sexista, com
raízes profundas na desigualdade de rendimento entre homem e mulher e cujas
profissões a mulher terá mais aceitabilidade porque não fazem parte da ambição
masculina, é de se esperar que sejam áreas tratadas com menos destaque das
pautas políticas. Isso é o que ocorre na área da educação básica no Brasil,
tendo em vista que as professoras compunham 81,5% do quadro do magistério em
2010 e sabemos o quão o salário docente é defasado se comparado com
profissionais graduados em outras áreas.
Lembrando que 8 de março é a luta
da mulher trabalhadora por uma sociedade mais justa, resgatemos esse princípio
para trazer a tona a luta das feministas que diversas vezes foram às ruas por
creche e educação de qualidade para seus filhos ou a luta de milhares de
professoras que historicamente deram aos seus alunos o “testemunho de luta,
lições de democracia”, como dizia Paulo Freire. Não somos tias de nossos alunos
e isso não significa menosprezar a figura da tia, mas sim tratar com
profissionalismo nossa profissão, lutando por ela. Tias não fazem greve, professoras
sim e, portanto, que nós, mulheres e professoras não deixemos que apaguem nossa
história.
Ana Paula Ferreira
Educadora e grevista