Quando se fala em “novo” se remete a algo que não aconteceu ainda, que está sendo gestado, algo inédito, surpreendente e em se tratando de educação, alguns podem imaginar uma educação focada no ensino de língua inglesa, no empreendedorismo na escola, no uso de tecnologias. Muitos acreditam, pautados em discursos de Banco Mundial ou de acionistas, que isso já traria uma inclusão dentro de um mundo capitalista, uma vez que a pessoa teria mais oportunidade de emprego ou montar seu próprio negócio e assim ter uma vida mais confortável.
Porém,
se quem gera emprego não é a escola, é a economia, precisamos nos perguntar
qual é o mercado no qual o Brasil se situa. Enquanto compramos produtos de
preços mais elevados tais como medicamentos, inseticidas, automóveis e produtos
manufaturados, somos um imenso celeiro mundial que vende laranja, soja, café,
carne, cana-de-açúcar e minérios. O que isso significa? Que há mais possibilidade
de empregos nas mineradoras, no campo ou em indústrias que processam os
alimentos.
Infelizmente
sabe-se que a realidade não é essa. Na ausência de uma Reforma Agrária, tem-se 73%
da área agrícola ocupada apenas por 10% de grandes imóveis rurais (Castro e
Moreira, 2021), cujas áreas muitas são improdutivas ou mecanizadas ao ponto de
dispensar a maior parte da mão-de-obra, empurrando os antigos camponeses para os
centros urbanos, que somam nas casas improvisadas, nos subempregos, na
violência urbana, no número de pessoas desempregadas.
Então,
os mais entusiastas por uma educação empreendedora podem considerar que se os
estudantes tivessem orientação relacionada aos negócios, poderiam futuramente ser
bem sucedidos nos seus empreendimentos. Isso não é realidade. Na escola em que
trabalho, uma professora de Matemática desenvolveu um projeto com os alunos
para que elaborassem o passo a passo de abertura e acompanhamento de uma
pequena empresa, observando capital, entrada, saída, custos, etc. Uma aluna que
na época fazia brigadeiros, participou do projeto e mais tarde, junto com as
irmãs, montaram sua própria lanchonete. O que aconteceu? Com a alta do preço
dos alimentos, se elas repassassem esse valor para os clientes, perdiam a venda,
se não passassem, não conseguiam pagar o aluguel. Consequência: fecharam o
estabelecimento. Não foi falta de vontade, não foi falta de trabalho, não foi
ausência de entendimento de mercado, mas sim, porque esse formato de mercado é
para poucos, e bem poucos.
Trata-se
de uma realidade cruel encontrada no capitalismo financeiro, haja vista que não
há fronteiras para o lucro e as imposições políticas, tarifárias, judiciais ou
de fiscalizações são cada vez mais difíceis de ser concretizadas. Exemplifico. Em
2018, a rede Walmart, que é a maior empregadora de comércio no mundo, superava
em mais de um milhão a empresa Amazon. Por outro lado, é a Amazon quem mais tem
lucros no varejo e juntamente a outras empresas que atuam no ramo digital, são
as que pagam menos impostos (Silvia Ribeiro, 2021).
Aliás,
isenção de imposto é própria das grandes corporações. A Vale do Rio Doce, que
foi privatizada na época FHC, tem isenção de uma média de 1 bilhão de reais por
ano (Brasil de Fato, 2019). Daí temos o triste cenário: não há emprego no
campo, tampouco há emprego na cidade e junto a isso, o Estado brasileiro, numa
aliança política com o grande capital, arrecada menos impostos desse grupo e,
portanto, não consegue injetar dinheiro em obras ou políticas públicas para
geração de empregos ou de renda.
Portanto,
não é a educação a propulsora direta por uma economia mais inclusiva.
Entretanto, de uma forma geral, o discurso recorrente é que se houver disciplinas
tais como “Projeto de Vida” ou conteúdos de Matemática financeira, ou se a
gestão escolar souber usar seus recursos, os estudantes já teriam condições de
vida digna no capitalismo. Então voltemos ao título. Seria possível uma
educação nova se problemas velhos não forem superados?
Listo
três pontos para pensarmos nesses gargalos. O primeiro seria uma defesa
substancial da escola pública. Isso requer revogar a PEC 55/2016 que controla
os gastos públicos, significa uma política ousada que ao invés de privilegiar a
iniciativa privada, invista pesadamente na esfera pública, pois em relação ao
disposto no Plano Nacional da Educação, menos de 1% das escolas se encaixam no
padrão de qualidade ali previsto (Daniel Cara, 2019).
Segundo:
uma educação que se faça contra a exclusão deve se posicionar frente aos
problemas sociais, políticos e econômicos. Não há neutralidade, nem nunca
houve. Aliás, o que houve historicamente é a ideologia burguesa que inculcou
valores de meritocracia, de naturalização da desigualdade, da individualização
da responsabilidade. Uma educação que se pretenda contra a exclusão, deve
questionar esse sistema que não gera empregos e culpabiliza os sujeitos pela
situação de fome ou de pobreza.
Daí
entramos no terceiro ponto: a escola sozinha não conseguirá reverter anos de
desigualdade perversa e o que mais precisamos não é de um Projeto de Vida, mas
de um “Projeto de Sociedade”. Pretendemos que haja empregos, direitos
trabalhistas, distribuição da riqueza, mais impostos sobre grandes fortunas ou
projetamos uma sociedade que obedeça a lei da selva em que comprar osso ao
invés de carne é tratado como se fosse algo natural? É urgente que a sociedade
pense sobre isso, pois caso contrário, terminaremos mais um ano e os problemas
continuarão os mesmos.
Ana
Paula Ferreira
Pedagoga e Mestra em Educação